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27 Jun Estudo de caso: Análise do filme Sangue de Pelicano
Sangue de Pelicano é um filme de 2019, do género drama e suspense, dirigido por Katrin Gebbe e protagonizado por Nina Hoss. O filme conta a história de Wiebke (Nina Hoss), uma treinadora de cavalos policiais que adota Raya, uma menina de 5 anos gravemente traumatizada. Quando Raya começa a mostrar comportamentos violentos e antissociais, Wiebke fica determinada a ajudá-la.
“Um drama, que prende a atenção do início ao fim. Conta a estória de uma domadora de cavalos, com alma de “Mãe Pelicano” diante de um desafio que evoca amor, renúncia, desespero e perseverança.” (Avaliação de um telespectador).
O filme traz uma forte e bela história que mostra amor incondicional, renúncia, desespero e perseverança como muito bem colocado por um telespectador no site Adoro Cinema.
Wiebke é uma talentosa domadora de cavalos, e demonstra suas habilidades domando os cavalos por mais ariscos, bravos e difíceis que fossem. Mora com sua primeira filha, que, não fica totalmente claro no filme, mas subentendido, que também é adotada. Mãe e filha estão entusiasmadas pela chegada da nova criança que será mais um membro da família, mas nem imaginam o desafio que enfrentarão juntas.
Chegou o dia de irem buscar Raya no orfanato, uma linda menina de 5 anos que passará uma semana na casa da família como protocolo para adaptação de todos. Havendo adaptação favorável, segue o processo de adoção.
No orfanato, Wiebke e a filha se deparam com um quadro. Param por alguns instantes e ficam observando atentamente. A funcionária pergunta se gostaram do quadro, e explica que os filhotes estão mortos, mas a mãe pelicano perfura o próprio peito e alimenta os filhotes com o próprio sangue o que os traz de volta a vida.
Inicialmente, Raya parecia apenas uma criança testando limites, reconhecendo o terreno, afinal, ela já fora devolvida por algumas famílias. Mas, desde os primeiros momentos, Raya já começa a dar os primeiros sinais de que havia algo diferente com ela, algo além deste teste de ambiente. Ao longo do filme vemos cenas em que Raya ataca a irmã, mata pequenos animais, abusa de um menino (filho de um casal amigo de Wiebke), desafia a autoridade da mãe adotiva o tempo todo, tem ainda um momento em que ao usar o banheiro Raya esfrega as próprias fezes em todo o banheiro, na própria pele e ameaça comer, quando Wiebke intervém. Todos esses comportamentos de Raya fazem sua mãe adotiva concentrar suas atenções nela, o que recente a primeira filha, que começa a desejar que Raya vá embora.
Após tantos episódios desafiadores, Wiebke leva Raya ao pediatra que encaminha Raya ao Psiquiatra, que ao fazer exames clínicos, relata que a criança apresenta Transtorno de apego reativo, quadro que surge após uma negligência emocional e experiências traumáticas. Inclusive sobre esse transtorno, uma pesquisa com crianças institucionalizadas em uma instituição localizada em São Paulo, nos traz:
“O Transtorno de Apego Reativo é caracterizado pelo desenvolvimento de formas perturbadas e inadequadas de estabelecer relacionamentos, geralmente por causa de uma história de maus tratos. Esta pesquisa teve como objetivo investigar sinais de Transtorno de Apego Reativo em crianças institucionalizadas. Portanto, 25 crianças (15 meninos e 10 meninas), com 4 a 12 anos de idade, vivendo em um abrigo na cidade de São Paulo, foram avaliadas utilizando o Desenho da Figura Humana (DFH), baseado nos 30 indicadores emocionais propostos por Koppitz. Os resultados mostraram que as crianças demonstraram timidez, afastamento, assim, como baixo interesse social, sentimentos de imobilidade, desesperança e agressão aberta em relação ao ambiente, inadequação e culpa.
Algumas das crianças apresentaram sinais significativos do Transtorno de Apego Reativo, principalmente do tipo inibido. Os critérios diagnósticos para o transtorno ainda necessitam precisão e mais pesquisas utilizando o DFH. Contudo, sugere-se que melhoras no ambiente das crianças, especialmente com as pessoas responsáveis por seu cuidado direto possam remediar os sintomas, assim como prevenir futuros problemas.”
Sendo assim, Raya não conseguia confiar nas pessoas por conta dos maus tratos e traumas que sofreu anteriormente. Somados a tudo isso, Raya ainda presenciou o assassinato de sua mãe (que era prostituta), quando tinha apenas um ano e meio de vida. Raya teve que permanecer por várias horas sozinha ao lado do corpo sem vida de sua genitora, e quando foram encontradas, o corpo da mãe encontrava-se com inúmeras mordidas, provavelmente feitas por Raya tentando ‘acordar’ sua mãe.
Os momentos de aparente normalidade nas relações que apresentou, não passaram de repetição de comportamentos que observou e reproduziu, como sorrir, por exemplo. O médico recomendou que a terapia começasse o mais rápido possível. Nos dias que se seguiram, Raya continuava a se comportar de maneira bastante disfuncional, colocando em risco as pessoas a sua volta e a ela própria, tendo atitudes como ter colocado fogo na própria casa, morder uma colega na escola que precisou ir ao hospital, esconder um estilete em sua cama e disse que ia tentar matar a irmã.
Em dado momento, em uma cena que Wiebke conversa com Raya sobre o episódio do fogo na escola e como e onde estava o isqueiro, Raya diz que tem uma ‘coisa’ que ela vê e que a manda fazer coisas ruins. A mãe volta ao medico e relata esse fato e ele confirma que é um elemento presente no quadro dela. O médico ofereceu uma vaga para Raya em um estudo mais aprofundado que é realizado na faculdade. Wiebke tenta resistir a essa alternativa, mas os desafios continuam, e ela resolve tentar. Mas, já na chegada, não deu nada certo, e percebendo que lá a menina não seria tratada com amor, Wiebke resolve voltar com Raya para casa.
Wiekbe está mesmo disposta, determinada, com vontade fortede amar e cuidar de Raya, por mais desafiador que seja. Essa mãe chega ao ponto de tomar medicamentos para que seu corpo produzisse leite materno, para amamentar a menina, na intenção de estabelecer com ela os vínculos inicias de cuidado e afeto que ela não teve acesso.
Os estudos de nossa filosofia nos esclarecem que: “o espírito faz sua trajetória neste planeta em condições apropriadas ao seu estado de adiantamento, passando em cada existência a vivenciar situações que lhe proporcionem maior progresso, até terminar a parte da evolução inerente a este mundo. Os atributos espirituais que os seres humanos demonstram constituem, apenas, reduzido número daqueles que podem revelar espíritos mais esclarecidos que, em virtude de maior grau de evolução, já não precisam mais de um corpo humano para evoluírem.” (RC 46, págs. 29 e 30).
A determinação de Wiebke, nos faz refletir sobre o quanto seu espírito é forte, possuidor de numerosos atributos espirituais, dentre eles se destaca claramente o da vontade, que tem o poder de subjugar o desânimo, a timidez, as fraquezas. A força de vontade é chama interior que conduz à vitória os seres humanos que a sabem alimentar, mesmo nas lutas mais árduas e difíceis da vida. A vontade é, portanto, a força motora das aspirações e realizações humanas. E “por ser a evolução espiritual o propósito da vida dos seres humanos na Terra, para alcançar tal fim todos contam com naturais atributos, aprimorando-os continuamente mediante reflexão, disciplina e ação. Os corajosos não receiam os fracassos – Vive com sabedoria o ser humano que, lutando sempre, dá valor ao que valor tem, enfrentando de fronte erguida os momentos difíceis, pois quem não os tem? Quem assume a responsabilidade pelo que faz sempre mostrará caráter bem formado. Confiante, estará preparado para a luta cotidiana, apto a enfrentar os embates que a vida terrena reserva a todos sem qualquer distinção, e deles sairá vitorioso. (Luiz de Mattos)
Por Patrícia Flores – Psicóloga – Militante e responsável pela sala de Cuidados psíquicos da Filial Belo Horizonte do Racionalismo Cristão
BIBLIOGRAFIA
Mattos, Luiz de 1860-1926 – Racionalismo Cristão – 46 ed.rev. – Rio de Janeiro: Racionalismo Cristão, 2023. 180 p.
Mattos, Luiz de 1860-1926 – Clássicos do Racionalismo Cristão-v.6 – Rio de Janeiro: Racionalismo Cristão, 2023. 136 p.
https://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/lil-667686#:~:text=O%20Transtorno%20de%20Apego%20Reativo,Apego%20Reativo%20em%20crian%C3%A7as%20institucionalizadas. (acessado em 02/05/2024)
https://www.adorocinema.com/filmes/filme-262708/ (acessado em 02/05/2024)
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